Ata da Assembléia do Naná
Mário Prata
Aos 22 de agosto de 1998, sábado, nas dependências de um apartamento situado na Rua
Pernambuco, nesta capital, deu-se a criação da organização não-governamental
denominada N.A.N.A (Nem Alcoólicos, Nem Anônimos), na presença dos seus três
sócios-fundadores, os escritores e jornalistas Fernando Gomes de Morais, Matthew Gary
Shirts e Mario Alberto Campos Morais Prata que secretariou e redigiu esta ata.
Entre outras providências, decidiu-se
que:
Podem afiliar-se ao Naná todos aqueles
que bebiam e não bebem mais, desde que não sejam anônimos.
Depois de acalorada discussão, chegou-se
à conclusão de que os afiliados serão denominados nanicos. Havia um facção que
tentava introduzir o nome nanistas, mas, por causa de prováveis trocadilhos futuros e
manuais, optou-se pela primeira hipótese.
Será encaminhada cópia desta ata e
convite para ingresso ao Naná aos senhores compositor Francisco Buarque de Holanda,
escritor João Ubaldo Ribeiro, dramaturgo Benedito Ruy Barbosa, jornalista Sílvio
Lancellotti, designer Flavio Del Carlo, entre outros.
Chegou-se à conclusão de que a vantagem
de tomar cerveja sem álcool é que, por ser pouco consumida, está sempre geladinha nas
geladeiras dos bares e restaurantes.
Por iniciativa do nanico Fernando, fez-se
um voto de louvor ao ex-governador Orestes Quércia, que proibiu o uso de bebidas
alcoólicas nas estradas paulistas, fazendo com que todos os postos tenham a sem álcool.
Ainda no item cerveja, o nanico Mateus
informou que no Pão de Açúcar, da Praça Pan-Americana, está em promoção cerveja sem
álcool, alemã, no que foi muito aplaudido.
Os recentes desempenhos sexuais dos
integrantes nanicos foram mutuamente ovacionados, incluindo a mulher de um deles.
Entre as atividades esportivas,
instituiu-se um campeonato de pôquer entre os nanicos com a finalidade única de entrarem
para o Guiness, pois será a primeira rodada de pôquer sem álcool, do mundo.
O sabor das comidas (qualquer uma)
também foi assunto efusivamente comentado e degustado.
Depois de duas caixas de cervejas, os sócios-fundadores, por unanimidade, chegaram à
conclusão de que, antes, não tinham mais idéia do que era acordar (muito menos dormir)
bem. Foi feita uma moção a todos os bares e restaurantes que servem a cerveja sem
álcool em São Paulo, no Brasil e - por que não? - no mundo.
Será feita uma vaquinha entre os nanicos
para que um dos sócios possa ir até a cidade de Madri, na Espanha, experimentar o lá
fabricado uísque sem álcool e, em caso de aprovação, importar algumas caixas e, se
possível, o Naná vir a ser o representante oficial de tal raridade, abaixo do Equador.
Decidiu-se que as roupas que não servem
mais aos associados (os três juntos emagreceram 31 quilos) serão doadas para
instituições de caridade que cuidam de alcoólatras em geral ou em particular.
Constatou-se que todos os signatários
presentes tiveram de mudar o grau dos óculos, uma vez que passaram a enxergar muito
melhor. E mais: dois deles deixaram de roer as unhas.
Foi prestada uma singela homenagem a
vários brasileiros que não bebem mais, como Vinícius de Morais, Tom Jobim, Tarso de
Castro, Marquito e Jânio Quadros.
Ficou definida como sede de campo do
Naná o São Pedro Spa-Médico, de Sorocaba. Jogos de futebol -- já que todos voltaram a
jogar, e bem -- será no campo particular do co-sócio Chico Buarque, no Rio de Janeiro.
E, por estarem todos embriagados de
lucidez, sobriedade e felicidade, deu-se por encerrada a reunião, com todos os presentes
fazendo um brinde (com suco de tomate importado) a Jesus Cristo, aquele que ficou famoso
por transformar sangue em vinho e vinho em água.
Texto extraído do jornal "O Estado de São Paulo", 1998.
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